segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Ortografia fatal

"E o amor
morreu
em fulminante
ataque
ortográfico,
ao pisar
em sibilante
cedilha
mal localizada..."

Peça

Nem sempre sei meu papel e, mesmo quando o descubro, não costumo seguir roteiros.

Gosto de ser mãe, mas às vezes necessito ser apenas filha; gosto de ser aprendiz, mas às vezes preciso ser mestra; gosto de ser tua, mas às vezes preciso ser só minha.

Descobri que todos estes personagens me habitam e ditam minha história.
Há momentos encenados em Babel, aonde todos gritam ao mesmo tempo e não consigo distinguir uma voz da outra; noutros, alguém sussurra tão baixo, que preciso cobrir as orelhas para escutar melhor.

Todas essas vozes unidas é que traçam a renda dos meus pensamentos. Todos os pensamentos unidos é que traçam o figurino que vês.

A peça é encenada sem ensaio, em apresentação única.

Se não te agrada, não subas no meu palco. Não devolvo o valor do ingresso, mas não cobrarei teu aplauso.

Iluminado

Essa luz esverdeada
que escorre
do teu sorriso
me arranca
qualquer tristeza
com precisão...

Haja coração!

Tuas mãos

Em tuas mãos,
meu mundo;
punhado de terra
que me trepida
morro abaixo,
quando encaixa
no fundo,
depois desliza
corpo acima
feito brisa quente
de primavera
e me carrega
infinito
acima.

sábado, 21 de setembro de 2013

domingo, 15 de setembro de 2013

Ansiedade

Te divido
minha vida
minhas idas
e vindas
minhas horas
mais lindas
ansiedades
partidas
verdades
costuradas
juntos
dois mundos
em um polo
duas vozes
em um solo
será
a derradeira
vez?



sábado, 14 de setembro de 2013

Discurso

Juro que tento copiar teu silêncio,
mas nem desenhando por cima
do papel manteiga
eu chego perto.

Estou na maré cheia
e meu discurso
 transborda,
me arrasta
e ameaça me afogar.

Te sinalizo em busca de socorro, mas calas...

Eu aspiro verbos,
que se adverbam
em meus pulmões.

Suspiro uma última interjeição,
aspiro tua rejeição
e bebo a primeira lágrima.





Parto


Nossa história nasceu de parto normal.

Começou com um notebook, um fim de tarde e um fim de namoro.

Um nome, que mais parecia codinome: Leo. Um “oi”. Uma resposta tão breve quanto a saudação.
Uma ligação telefônica que esgotou a bateria do “ai fone cinco”; Um chimarrão entupido; um almoço às quatro da tarde de um domingo chuvoso e frio.

Culpa de São Leopoldo... Tão distante de Porto Alegre, lá no céu; culpa do frio, que aproximou os dois debaixo do cobertor.

Não estou bem certa se a fecundação ocorreu no momento em que tatuaste tua mão no meio das minhas costas, naquele abraço de me enfiar inteira dentro do teu peito, ou quando afastei os cabelos da nuca, para dormir de conchinha.

A ânsia pelo resultado do “teste” durou dois dias. Positivo.  

Mas gestar no coração é mais complicado, ainda mais quando ambos os órgãos sofreram abortos prévios e gestações ectópicas.

Houve a insegurança, o ciúme, teus  silêncios, meus excessos de discurso.

Ainda assim, o amor-feto foi crescendo. As células se multiplicando geometricamente em beijos, carícias, cuidados e saudades. 

Gradativamente, tudo tomou forma: o gosto literário, musical; o gosto do beijo e o do feijão novinho.
Teu cheiro começou no travesseiro ao lado, e foi tomando a casa até que, de “minha”, ela ficasse “nossa”. Depois, não satisfeito, tomou minha pele e minhas horas.

Cada ausência, cada discordância discursiva virava ameaça de aborto.  Mas não partiste, e a gestação prosseguiu até o parto.

Talvez tenha sido prematuro. Foi rápido, mas não indolor. Foi natural. Deixou cicatriz indelével. Foi bipolar, como nós.

O parto do nosso amor foi quando teus livros foram morar na minha estante, e eu percebi que não partiriam mais.



quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Maturação

Ainda sinto o cheiro
de temporal
e um aperto no peito,
que não tem igual,
mas, de repente,
tudo está diferente...
não,
nada
nunca
será "normal"
mas, ao teu lado,
há uma semente
de tranquilidade
que brota
tímida
e ainda incerta,
do solo,
do sol,
da chuva...
ainda...
ainda...
ainda...
uma hora o receio finda.

sábado, 7 de setembro de 2013

Como disse?

O que acontece afinal? Será alucinação? Um sonho? Não ouço quase nada! Minha audição! O que acontece? Mal escuto minha própria voz! Mas o que é isso? Estou sozinho em casa, ainda acordando e tentando acreditar que isso esteja acontecendo comigo. Surdez? Na minha idade? Mas talvez, apenas esteja sonhando. Sabes aqueles sonhos dentro do sonho? Deve ser isso. Estou ainda dormindo sonhando que já acordei e não consigo escutar quase nada, e nesse momento, sonho que acordo, mas continuo dormindo e ainda surdo. Wow! Mindtrick!

Não deve ser isso, é muito real para ser sonho. E muito mais real ainda para serem aqueles malditos sonhos dentro de outro. Merd! Assumo então que estou surdo? Admito de pronto? Já sei, ligo agorinha para o convênio e marco um otorrino... Raios! Sempre tenho que lembrar de ornitorrinco para lembrar de otorrino, êita inconsciente maleva! Mas...não teria como mesmo. Ligar para o ornitorrinco, digo, otorrino, que jeito se não escuto?
Tenho que usar melhor a cabeça! Pensar com lógica! Lembrar que agora é uma cabeça sem ouvidos... Pense rapaz! Pense!

Não posso e não devo continuar com esse autoengano, autoengodo auto... Diacho! Nada está “auto”, agora está tudo baixo. Baixíssimo! Inaudível! Mas tentar convencer a si próprio que isso aconteceu do nada, não. Não mesmo! Não é de hoje que venho escutando cada vez menos, dia a dia cada vez menos. Uma hora iria estourar, oras! Estourar... como se fosse possível de acontecer... Mesmo que acontecesse, não iria ouvir mesmo.
Porque tapei o astro rei com a peneira? Porque não escutei a voz da minha consciência? Escutar... escutar? Isso dará boas piadas em algum texto, talvez. Mas não tenho tempo mesmo para escrever, ora pois. Pri-o-ri-da-de agora! Uma solução! Pense moleque! Pense!

Sintomas ignorados por meses, os intermináveis:
-Hã?
-Que disse?
- Hei! Volta a fita, não escutei o que o Norman disse pra mamãe dele!

Estava na cara! Se encontro-me nesse estado, foi por protelar e protelar, até essa manhã fatídica! Imagine! Talvez eu nem possa mais degustar a sonoridade da palavra “fatídica”. Estou assustado. É fato!
Jesus! Terei eu de usar aqueles aparelhos para surdez? Aqueles cor de carne, imensos e que ficam presos na orelha e sempre desviam o olhar de seu interlocutor direto para seu pavilhão cartilaginoso auditivo e de lá não voltam mais para seus olhos? Pôxa! Além de feiosos, esses gadgets ornamentais, devem custar os olhos da cara! Um pouco de sorte, imagine se custassem os ouvidos? Pendurar aquilo onde? Minha esperança é que tenha pelo menos a opção de troca de capinhas, por outras cores sabe? Como os relógios Champion, com uma cartela de cores, todas bem New Wave... Tomara! Tomara!

Chega de se lamentar! Mesmo não tendo tempo, vou tomar uma atitude! Não posso ficar sem escutar, sem ouvir! Imagina! Não tenho dinheiro para um aparelho troca capinha e muito menos para consultar como ornitorrinco!
Preciso da minha audição de volta! Agora basta! Parto agora mesmo para o barbeiro mando cortar essa cabeleira e finalmente voltarei a escutar!

Cabelo cobrindo a orelha, minha gente, não dá mesmo!

Eleagaesse

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Aviso

De repente,
um tremor entra
sem convite
e me acaricia
com mãos ásperas,
sem que eu evite.

Uma aspereza
que eu conheço
de longa data
e que anda pareada
com uma tristeza
que mata.

Um sentir,
 bem feito
de textura;
de loucura
sem jeito
de mentir.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Diálogo bipolar 1

-Ai meu DeusdoCéu!
-Do céu tá em falta. só tem de umbigo.
-Mas aí é laranja. Não fica bem com seu tom de pele.
-Ih, já tá a-pelando...
-Você, que só me quer pelado!
-Que nada, de pelado, basta um...precisamos sobreviver.
-Mas é difícil sobreviver à tanta implicância!
-Isto é porque toda vez que implico, você replica...
-AiiiI! Há vezes em que a vontade que tenho é fazer picadinho de você!
-Ok, mas sem laranjas, por favor. Elas só vão bem com feijoada!
- Seu porco!
- É, também vai bem na feijoda...
- Ora vá...
-Fui...está ficando perigoso por aqui...ouço os rinocerontes chegando! Saída estratégica pela direita!